RECORDAR É VIVER…

Pedágio: as mulas já temos –
Voltamos à era das carroças, andando por estradas de terra. Foi a este desvio que o governador urbanista conduziu os paranaenses, ao puni-los com pedágios escorchantes pelo delito de serem donos de veículos automotores e desejarem trafegar por estradas asfaltadas, já que as construiram.

Agora só faltam as carroças. As mulas já temos. Estas, todos sabemos onde estão. Como são mulas, têm cabeça de mula. E quando empacam, ninguém as tira do lugar, justamente porque, por terem cabeça de mula, raciocinam como mulas.

Com toda a reverência e toda a gratidão a esses valorosos animais, que tanto serviço têm prestado ao Brasil, especialmente no tempo das carroças. Mas as mulas sempre se assumiram como mulas, nunca regrediram. Já o homem que assume o papel de mula, este regrediu.

Com o golpe do pedágio a estes custos – sem precedentes na história de povos civilizados – e o retorno às estradas de chão batido, o Paraná começa a progredir como rabo de cavalo (ou de mula): crescendo para baixo.

O governador quer indústrias automobilísticas em nosso Estado, mas pune quem tem automóvel. No mínimo uma incoerência. Está na hora de os burros (que carregam a carga) começarem a relinchar!

Estranha que, com todos os 8 milhões de paranaenses protestando, as lideranças das classes produtoras estejam paradas, inertes. Porque elas têm poder de organização e mobilização, têm força política, e seria imprudência permitir que a paciência do povo chegasse ao ponto de combustão, que aí as consequências seriam imprevisíveis.

É hora de um despertamento das sociedades rurais, dos sindicatos da produção, das cooperativas agrícolas, dos clubes de serviços, da maçonaria, das promotorias de Justiça (que existem para defender a sociedade), dos prefeitos, mesmo os do partido do Governo instalado. Não há que temer nada. Ainda mais agora, em época pré-eleitoral. Já se sabe que não podemos contar com os deputados, pois eles, segundo foi dito por Neco Garcia, estão endividados no Banestado e não vão querer brigar com o governo. Ademais, o deputado-chefe nem permitiria que ousassem abrir a boca.

Dia destes um caminhoneiro, carregado de razão, parou seu veículo diante do pedágio e disse que dali não saía. Resultado: chamaram a Polícia, ele foi punido com pesada multa. Se bobear, ainda leva bordoada. Porque arbitrariedade oficial é que não falta.

Estava bem intencionado o homem, mas não é por aí. Um caminhão não são mil caminhões…

Nem nos tempos da ditadura houve tamanha prepotência como a que o governo paranaense comete agora contra o povo. Naqueles anos a luta era em defesa de uma ideologia – e não importa no momento discutir os seus méritos e deméritos – mas nunca o povo foi esguelado. Os militantes políticos, mesmo os cidadãos do povo que se insurgissem, eram ferrados, impiedosamente, mas havia um respeito aos pacatos cidadãos.

Ato tão insolente como este do governo paranaense só o da ministra que confiscou o dinheiro do povo.

Já escrevemos que cobrança de pedágio existe em todos os países desenvolvidos, foi um grande invento para possibilitar a entrada da empresa privada no gerenciamento de um serviço público como a rodovia. Mas lá, os ganhadores das concorrências construiram as estradas, para depois cobrar pedágio.

Aqui não: nós, o povo, é que as construímos. O valor do pedágio, então, deveria corresponder apenas aos custos de manutenção dessas rodovias e de funcionamento dos serviços pertinentes. Portanto, uma cobrança de frações de real: R$ 0,30, R$ 0,50. Diante de uma rodovia nova que a concessionária construísse, ou da duplicação das atuais, aí chegar a R$ 1 ou pouco mais, porque assim foi e assim é nos países que idealizaram e adotaram a privatização de rodovias.

Não podemos financiar a empresa privada, adiantando-lhe dinheiro para que construa novas estradas só daqui a cinco anos. Isto é privatizar o ganho (dela) e socializar o custeio… Que privatização é esta?!

Já temos dito que nossos governantes gostam de citar os países adiantados quando eles têm algo de ruim que se assemelhe a coisas nossas. ‘‘Estão vendo? – eles exemplificam, delirantes – lá também tem desemprego, também tem pobres’’, e isto e mais aquilo, mas não imitam esses países naquilo que têm de bom.

Quando viajam para fora, sentem-se mal diante das coisas públicas que funcionam bem e vivem na espreita de surpreender algo torto. Pode ser um caso em mil, mas aí eles se deleitam e citam e mostram e até batem fotografia. No caso dessa cobrança alta do pedágio, está bem evidente que nossos governantes só imitaram o lado ruim (cobrar), mas não o lado bom (uma tarifa sustentável).

Nos países adiantados, o pedágio é fração de dólar, até US$ 1 ou pouco mais. Nossos governantes não copiaram estes valores. Nem o modelo de que construir a rodovia, e mantê-las, é por conta da empresa ganhadora da concorrência. Ou então não seria privatização!

WALMOR MACCARINI é jornalista em Londrina
Matéria Publícada no Jornal Folha de Londrina: 9 de julho de 1998.

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